segunda-feira, 10 de agosto de 2015

A vida sensível- Emanuele Coccia

“Vivemos porque podemos ver, ouvir, sentir, saborear o mundo que nos circunda”. Para que cheguemos ao estágio de pensamento é preciso que as imagens sejam captadas pelos sentidos, os quais irão determinar os conceitos para cada coisa. Sem essa associação, as imagens seriam vazias e conduzidas a nada. Assim, nota-se que a sensação possui enorme influencia sobre a vida humana, embora esta permaneça ainda pouco explorada. “Enfeitiçada pelas faculdades superiores, a filosofia raramente mediu o peso da sensibilidade sobre a existência humana”, assim, a filosofia muitas vezes esteve interessada na razão do homem, e desta forma, deixou-a separada das experiências sensíveis, o que de fato é um erro.  “Todo o homem vive no meio da experiência sensível e pode sobreviver apenas graças às sensações.”

A vida animal, que diz respeito à vida sensível em todas as suas formas, pode ser definida de maneira simples como uma faculdade particular de articulação de imagens. “Cada animal não é senão uma forma particular de abertura ao sensível, uma cerca capacidade de apropriar-se dele e de interagir com ele”. Assim como a faculdade em questão opera sobre o alimento, a faculdade sensitiva precisa do sensível para poder ativar-se, e esta última quem dá nome e forma aos animais. “O sensível define as formas, as realidades e os limites da vida animal. Portanto, para que a vida existe e se dê como experiência e sonho é necessário que exista o sensível”. As imagens e o sensível não são frutos apenas do funcionamento cerebral, é preciso perceber que elas existem, antes, fora de nós: “o sensível não é algo meramente psíquico. Em síntese, sabe-se que o mero contato entre o sujeito e o objeto não produz percepção. Para que isso ocorra, precisamos de um meio, de um espaço intermediário que não é, contudo, um vazio, é “sempre um corpo, sem nome específico e diferente em relação aos diversos sensíveis”, mas que, entretanto, mantém a capacidade comum, a capacidade de poder gerar imagens. Esse corpo intermediário se faz conhecer, em todas as suas propriedades, no espelho.

O espelho é um lugar simultaneamente exterior aos sujeitos e aos objetos, e é nele que estes transformam o próprio modo de ser e se tornam fenômenos, e “colhem o sensível que precisam para viver”.  O espelho é um lugar intermediário por excelência, porém não é o único. “A imagem é a existência de algo fora do próprio lugar”, assim, tudo que exista fora do seu próprio lugar se tornaria imagem. De modo que, podemos dizer, não existe intimidade nem uma oposição entre corpo (exterior) e alma (interior), mas sim, para falarmos com Lacan, uma extimidade, uma intimidade estranha a si mesma, que o sujeito não contém, não lhe é própria.


“O ser das imagens é o ser da estranheza”, ou seja, as imagens não têm uma essência e um ser natural, mas sim o que chamamos de “esse extraneum”.

A capacidade daquele que vive de produzir imagens, “é surreal pela sua capacidade de veicular.” Se somos afetados pelas imagens e somos capazes, ao mesmo tempo, de produzi-las, somos vidas sensíveis. Possuímos um corpo extensivo aos limites do mundo, aos limites do sensível. 

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